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6.10.14

Prédio.

Para ouvir: Mary Lambert - She Keeps Me Warm

Ela olhava para ele com ares de desprezo, mas por dentro, tudo estava desmoronando.Talvez, desmoronando não fosse a melhor palavra, o certo mesmo seria dizer que tudo estava se construindo.
A cada cliente que ele atendia e dava aquele sorriso - um deles na verdade, Levi tinha tantos deles que ela sempre ficava se perguntando o que cada um queria dizer - algo dentro dela mudava.Um tijolo subia como que por telocinese dentro dela, e pouco a pouco, esses tijolos estavam construindo alguma coisa.Em apenas uma semana que se conheciam (só isso mesmo? parecia que havia se passado uma vida desde que ela o encontrou dentro de seu quarto, todo perdido) já havia ali um belo alicerce de uma cosia que levava todo jeito pra ser um prédio de mil andares.A cada sorriso, a cada olhada que ele dava a ela, todo terno e brincalhão, paredes inteiras eram feitas.
Ela ficava lá, sentada na mesa de perto da janela, apenas observando ele trabalhar.O cabelo que era um loiro avermelhado, sempre tão bagunçado e já marcado de tanto ele puxar para trás com as duas mãos, estava escondido por uma touca verde e ela não conseguia parar de pensar em como queria ver aquele cabelo novamente.Acendeu um cigarro, deu um trago devagar e pensou que seria bom ir lá dar um oi.Estava pensando nisso enquanto olhava os carros passando lá fora quando sentiu alguém se aproximar da mesa.
- Oi - ele disse, com um de seus tantos sorrisos e já sem a touca verde.Ela sentiu sua perna ficar mole, e a cabeça rodou um pouco.Efeito do cigarro talvez.
- Oi bonito -  disse assumindo sua pose de autoconfiança.Por fora, não estava nem prestando atenção nele.Por dentro, havia um letreiro de led vermelho piscando e gritando bem alto o quanto ele era lindo - estava aqui ensaiando ir lá te dar um oi, mas vi que você estava trabalhando muito.
- Três e quinze - ele disse apontando para o relógio que ficava em cima do balcão da loja - horário do almoço.
- Ah, que bom que aqui vocês param pra comer - ele riu - Tava pensando em comer onde?
- Não sei.Estava pensando em chamar uma moça sentada aqui pra comer alguma coisa comigo, mas não pensei direito onde comeríamos.
- A é?  - ela bateu o cigarro no cinzeiro da mesa devagar e o olhou com os olhos baixos (tática que sempre funcionava) - então vai depender de quem você vai chamar.Se for chamar aquela senhora com um cardigã amarelo sentada do outro lado da sala - ela apontou o dedo com cigarro na direção - acho que ela gostaria de comer em um restaurante com um menu cheio de nomes estranhos e tal.Se fosse chamar aquela mocinha de camiseta da Hello Kitty sentada daquele outro lado - ela repetiu o gesto na direção da menina que devia ter no máximo 11 anos - acho que levá-la aquela sorveteria dentro do campus seria uma boa escolha.Resta saber se aquele senhor que está com ela aprovaria um cara igual você levar a sua filha para tomar um sorvete.
- Um cara como eu? - ele riu e puxou os cabelos pra trás com as duas mãos - que tipo de cara eu sou?
- Ah, esse tipo de cara.Cara bonito, com cara de má companhia e que costuma deixar as mulheres tontas.Tipo esse carinha aqui.
- Que carinha aqui?
- O cigarro - ela sorriu seu maior sorriso.Outra técnica.
Ele riu e sentou-se na cadeira ao lado dela.
- E se eu quiser chamar a menina de jeans e blusa cinza fumando perto da janela? Onde você acha que seria bom leva-la?
- Pro seu quarto.
Seguiu-se um silêncio gostoso.Ao contrário dos silêncios tensos de quando você deixa claro sua intenção por alguém e essa pessoa demora a responder, Levi era muito transparente.Ela ficou apenas curtindo a cara de espanto dele, e vendo, pouco a pouco, um de seus tantos sorrisos se formar em sua boca.Dentro dela, um andar inteiro foi construído - com acabamento e tudo.