Pegou a primeira jaqueta que viu e foi para a rua.Sem bolsa,
no bolso apenas o necessário: cigarro,dinheiro para o café, o celular e a chave
do carro.O vento frio fez seu rosto arder.Seguiu dirigindo até aquele café no
automático.Sabia o que aconteceria ali.Toda vez era a mesma coisa: ele diria
que não dava mais e iria embora sem olhar para trás.
E isso aconteceu quantas vezes nesses 5 anos? Ela já perdera
as contas.Porque ela sabe que ele sempre volta.Mas ela sabe que mesmo ele
sempre voltando, a dor infinita que ela sente é sempre a mesma.Ela seguiu seu
caminho, já chorando.
Ele já estava lá, sentado na mesa perto da janela, olhando
melancólico as gotas da chuva deslizando no vidro.Pensava nela.Nela e no sorriso dela e do porque eles sempre chegavam nesse ponto.Ele não poderia dizer que dessa
vez era diferente.Estava sendo igual todas as outras vezes, quando as brigas chegavam a
um ponto inimaginável e a situação ficava insustentável.
Ela subiu a escada de madeira envernizada escura do café
olhando para baixo.O viu sentado na mesa, mas passou reto e foi para o
banheiro.Sabia que a maquiagem estaria borrada e queria que ele não visse isso, pelo menos dessa vez.
Ele a viu subindo e ia levantar, mas percebeu as lágrimas de maquiagem preta e ficou sem reação.Odiava vê-la chorando.E via muito.E quase
sempre era a causa dessas lágrimas.Ele queria abraça-la e pedir desculpas por
tudo, queria falar que estava sofrendo até mais do que ela.Mas não podia.
Enquanto arrumava a bagunça de maquiagem e lagrimas ,ela tentou
arrumar a bagunça da sua mente.O fim era sempre horrível, mas com o tempo
melhorava, ela sabia disso.O problema era que sempre que estava ficando
suportável, que ela começava a sair e conhecer gente, que ela voltava a dormir
e comer normalmente, ele voltava e bagunçava tudo de novo, com aquela barba por
fazer e o moletom verde e com aquele perfume que tirava toda a razão dela.Respirou
fundo e foi em direção a porta de saída.
Ele observou quieto enquanto ela sentava na mesa.Não tinha
mais maquiagem borrada no rosto, mas o nariz estava vermelho e isso significava
que ela tinha chorado.
- Quer alguma coisa para beber? – ele perguntou com cuidado,
como quem apalpa a uma parede no escuro em busca de um interruptor.
- Não, obrigado – ela deu um meio sorriso e fungou um pouco –
você queria falar comigo?
- Queria sim – ele começou a rodar a aliança dourada em cima
da mesa feita da mesma madeira que a escada – na verdade, você já sabe o que eu
quero falar.
- Eu sei – ela olhou para baixo – se é só isso, posso ir? Eu
tenho que dar o remédio da gata, aquele, você sabe, não quero atrapalhar o
tratamento todo.
- Não, senta aqui vai.Vamos conversar.
- Conversar o que? – ela sorriu amargamente – não temos o
que conversar.Acabou.Posso ir?
Ele sabia que ela estava irredutível e apenas concordou com
a cabela.Ela levantou e estava virando para ir embora,mas parou.Parou e
voltou para a mesa.
- Me faz um favor agora? – ela disse calmamente.Uma calma
que até a surpreendeu.
- Claro – ele disse levantando e ficando a centímetros do
rosto dela.
- Não volta tá? Tô cansada de ser sua a hora que você
quer.Dessa vez, não volta.Se você ainda gosta um pouco de mim, fica no lugar
pra onde você vai agora.Enfim, é isso.Boa sorte.
E eles se beijaram.Foi instintivo, normal, mais por hábito
do que por qualquer outra coisa.Começaram a se beijar, e quando ela foi se
soltar para ir embora, ele não deixou e eles continuaram se beijando.E
começaram a sentir, no meio do beijo, o gosto da lágrima um do outro e isso só
fez eles se beijarem mais e chorarem mais.E ficaram tempo demais assim, até que
um garçom teve que pedir para eles pararem.
-Bom, é isso – ela disse enxugando as lágrimas.
Ele a abraçou e nesse instante se arrependeu.Percebeu que
era isso, eles se amavam e tinham que ficar juntos.Mas não conseguiam.
Ela se soltou do abraço e sorriu.
- Eu vou acabar voltando – ele disse, pegando a mão dela.
- Você pode voltar.Mas isso não significa que dessa vez eu vá te
aceitar de volta.
Ela virou e saiu.Dessa vez, foi ela quem não olhou para
trás.A dor começava a explodir e ela chorava muito, mas dessa vez seria a
ultima.Antes de entrar no carro, olhou para cima e conseguiu vê-lo pela janela,
com as mãos na cabeça.Talvez estivesse chorando, ela não sabia bem, não dava
para ver.Acendendo um cigarro, sussurro um “Adeus” no meio do turbilhão de
lágrimas que brotavam daqueles olhos cansados.
Ele continuou sentado no mesmo lugar, mas agora chorava.Como
sempre, se perguntava o porquê tinha feito isso.Mais um fim.Ele só torcia para
ela aceita-lo de volta, porque ele voltaria.Mais cedo ou mais tarde, ele teria
que voltar.Da janela, conseguiu ver o carro cinza dela indo embora. “Até mais”
, ele sussurrou entre uma lágrima e outra.
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