Para ouvir:Com ou sem você - Strike
Chovia.Ninguém me atendia no celular e eu sinto que minha gripe iria evoluir pra uma bela pneumonia.Mesmo assim eu não ficaria dentro daquele carro.Tentei mais uma vez no celular.Nada.Tá, o fato de ser duas e quinze da manhã deve influenciar em alguma coisa nisso.Mas eu não ligava.Não nos falávamos a o que, mais de um ano.Eu tinha me segurado demais e agora eu precisava disso pra ficar em paz comigo mesma.Termina esse cigarro e vai Marcela.
Abri a janela e joguei o filtro rosa do cigarro na rua.Abri a porta e sai do carro.As gotas de chuva estavam grossas e frias, e até atravessar a rua, eu já estava bem molhada.
Em frente ao portão eu perdi um pouco a coragem.Aquele botão pequeno do interfone que gritava pra mim o número 7 nunca me pareceu tão grande.Apertei uma vez.
Meu cérebro pedia um cigarro e gritava SAI DAI SUA LOUCA.Meu coração batia num ritmo tão frenético que falava meio gago SE É O QUE VOCÊ QUER, PROSSIGA.
Não tive resposta.Apertei a segunda vez.
Eu estava começando a enxergar a situação.Lá estava eu, as duas e quinze da manhã, ensopada atrás de alguém que eu não via/falava a mais de um ano.
Apertei a terceira vez.Tá , se não tivesse resposta eu iria embora.Mas era demais pensar que eu não o veria hoje.Eu precisava.
- Oi - me atendeu uma voz de sono.
- Oi ,Caetano? É a Marcela.
- Marcela ? O que...
- Desce.Preciso falar com você.
- Tá chovendo.
-Eu não te perguntei como está o tempo Caetano.Desce por favor.
Desligou o interfone.Eu já estava preparada pra dar meia volta e ir embora quando o vejo descendo as escadas.Meu Deus, parece que a cada dia que passa ele fica mais lindo.O cabelos estava maior e ... sem dúvida tinha mais tatuagens.E caralho como eu senti falta daquele rosto nesse tempo.
- Você tem sérios problemas guria - ele disse forçando uma cara de bravo.
- Eu também não vim aqui pra você me falar o que eu já sei.
- Então você veio pra que ? Meu Deus, você tá toda molhada.
- Eu sei.
- Eu te convidaria pra subir, mas minha namorada está lá em cima.
- Tá, já tá bem difícil eu estar aqui, então se você parar de falar e deixar eu fazer o que eu vim aqui pra fazer.
- Tô quieto.
- Volta.
- Pra onde?
-Pra mim.Pra minha casa, pra minha cama.Pra minha estante que tá vazia sem seus livros.Volta pro lugar de onde você nunca devia ter saído.
- Já faz mais de um ano.
- Eu sei.
- E você ouviu a parte do 'minha namorada está lá em cima'.
- Ouvi.
- Sua resposta é essa.Se cuida, eu sei que qualquer chuvinha você fica bem doente.Vai pra casa e toma um banho, não morre não tá.
Foi embora.
Eu estava em um torpor tão grande que acho que não percebi o que houve.Voltei para dentro do carro, acendi o cigarro e dirigi sem música até meu apartamento.Sem uma lágrima derramada.
Estacionei o carro, entrei , tomei um banho, tirei a roupa molhada e já deixei separada a carteirinha do convenio que eu sabia que teria que usar no outro dia.Fiz um chá quente que tomei olhando pro nada.Quando deitei na cama o sol já estava tímido lá fora.O céu estava laranja e as pessoas começavam a sair pra trabalhar.
Deitei tentado não pensar em nada, tentando esquecer o que tinha acontecido.Você tentou.Agora pode dizer que fez tudo que podia.Você havia errado em te-lo traído e estava pagando por isso nesse um ano.Foi uma traição besta "mas se você me amasse nunca teria feito isso".Sai da minha cabeça amor.Vou te chamar de amor nos meus pensamentos pra sempre, aproveitando que ninguém ouve , e que você pode ser meu pra sempre neles.
Eu estava pegando no sono quando o interfone tocou.Deve ser o porteiro falando que eu deixei o carro na vaga errada de novo.
- Eu já desço pra tirar o carro Sr.João.
- Doida.
- Caetano?
- Só vim ver se você tá viva depois da chuva de ontem.
- Tomei um banho e aquele chá que eu sempre tomo, mas tô com aquela dor nas costas, então vou dormir um pouco e vou no médico mais tarde.
- Deixa eu subir pra fazer um chá decente, porque o seu é horrível.
Abri o portão.Eu o conhecia muito bem e sabia que se ele veio até aqui pra fazer o chá, era isso o que ele faria.E iria embora.
Subiu com uma mochila.Me abraçou forte .Se não fosse pela minha dor nas costas, seria o momento mais perfeito da minha vida.
- O que tem na mochila?
- Psiu.Deita que eu vou fazer o chá pra você.Cadê seu remédio?
- Acabou ...
- Tá - entrou no meu quarto e saiu de lá com travesseiros e um cobertor grosso- então você fica ai que eu vou na farmácia comprar - arrumou os travesseiros nas minhas costas e jogou o cobertor por cima de mim - eu trouxe aquele filme com o cara que faz o vampiro que você tanto gosta - pegou o controle em cima do da tv e colocou o filme pra rodar - eu já volto.
Fechou a porta com cuidado levando a chave.
- Seu porteiro ainda me conhece - ele riu.
Ouvi barulhos na cozinha.
- O que você tá fazendo?
- Seu chá.
Alguns minutos depois ele voltou com uma caneca de chá quente.Me deu a caneca, sentou se comigo e coloco meus pés em seu colo.Como nos velhos tempos.
Eu queria, e queria mesmo prestar atenção no filme, mas ele estava lá.Comigo.Depois de um ano ele estava na minha casa, fazendo o chá que eu tanto amava e cuidando de mim do mesmo jeitinho.Eu sempre me odiei por te-lo traído, mas hoje o ódio de mim mesmo estava no ápice.Porque eu tinha a absoluta certeza que depois do filme ele me daria um beijo na testa e iria embora.Eu nunca quis que o filme demorasse tanto.
- Obrigada.Por vir aqui cuidar de mim... Pelo chá.Obrigada.
- Assiste o filme guria.
O filme acabou e eu chorei no final.Na verdade, na hora eu não sabia se eu chorava com o final do filme ou pelo final dele.Eu sabia que seria a hora da despedida e meu Deus, como isso iria doer.
- Tá melhor ?
- Sim - disse me arrumando no sofá- e tem como não estar?
Ele levantou e levou a caneca para cozinha.
Depois, sentou no mesmo lugar que estava , pegou o controle da minha mãoe e começou a zapear os canais.
- Cadê os meus canais de jogo e luta?
- Cancelei - disse olhando pra ele apoiando a cabeça no braço que estava apoiado no sofá - eu não gostava daquilo.E não tinha ninguém aqui pra ver.
- E seu outro namorado? Ele deveria gostar de luta.
- Não teve nenhum outro Caetano.Depois de você, não teve ninguém.
- Só durante né - ele disse levantando do sofá- bom acho que você já acorda melhor.Dorme um pouco guria, você não dormiu desde a hora que chegou.E eu tenho que resolver uma coisas também.
Ele pegou a mochila que estava no chão e foi tirando alguns livros (que eu conhecia muito bem) de dentro dela.Colocou exatamente no espaço que eram deles antigamente.
-Ainda faltam alguns, eu volto mais tarde pra trazer.
- Volta? - eu perguntei levantando do sofá.
- Você pediu lembra? Voltei.Agora liga pra tv a cabo e pede meus canais de luta e jogo de volta amor.Porque eu tô voltando pra ficar.
-Eu ligo depois - disse o abraçando com força- agora minha cama andou me contando que está com saudades de você e desse seu cheiro - disse começando a beijá-lo.
- Calma amor.Ainda temos muito o que conversar - e voltou a me beijar - mas isso pode esperar um pouco ...
- Pode - eu disse tentando tomar ar - isso e a ligação pra tv a cabo.
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