Para ouvir: Black - Pearl Jam
Já era a 4° ou 5° vez que eu e Caetano saíamos, e ainda não
tinha acontecido nada.Nós sempre ficávamos bem próximos, riamos de besteiras,
ele me dava a blusa no final da noite quando esfriava,e o clima estava ali, mas
nada.Eu já estava começando a me conformar com posto de melhor amiga, que você
sai para ir no cinema quando não tem muito o que fazer no sábado a noite.Eu só
não entendia o porque das mensagens de bom dia, das músicas compartilhadas no
mural daquela rede social.Todas as outras noites eu ainda tinha esperança que
ele me olhasse e visse que eu sou sim uma menina legal, até um pouco bonita e
com potencial para namorada, mas essa noite eu já não tinha esperança alguma.Primeiro,
porque ele me chamou para ir em um bar de motoqueiros, que toca metal e mal tem
espaço para você se mexer.Não era nada romântico,nada que inspirasse um
primeiro beijo (a menos que começasse a tocar “Always” do Bon Jovi ou “Crazy”
do Aerosmith, mas não era provável que isso acontecesse) .E segundo porque
também iriam alguns amigos dele.Se ele não me beijava quando estávamos
sozinhos, no cinema, assistindo uma comédia romântica fofa e tocando uma música
propicia, porque ele iria me beijar em um bar amarrotado, tocando música pesada
e com vários amigos por perto?Era oficial: eu estava na friendzone.Mas o que
fazer? Ficar longe daquele cabelo no queixo era difícil demais, então por mais
que eu prometesse para mim mesma que nunca mais sairia com ele, era só meu
celular vibrar um convite que eu estava abrindo o guarda roupa para ver o que
eu tinha de mais legal para impressiona-lo.Alias, mulher tem dessas, acha que
uma blusa vai fazer o cara se apaixonar.
Como combinado, nos encontramos em frente a estação de
trem.Ele disse que o bar ficava perto, o que era verdade se você está acostuma
a fazer uma peregrinação pelo Chile para chegar nos lugares.Ele disse que os
amigos estariam já no bar, e fomos conversando sobre o dia pelo caminho ( daria
tempo de casarmos e termos filhos de tão ‘perto’ que era esse bar) .Chegamos,
os achamos e os cumprimentamos.Eram 3 homens e 2 mulheres, não contando eu e
Caetano, e já logo de cara percebi que uma delas ficou muito animadinha com a
chegada dele, cochichando com a amiga e mexendo no cabelo.Mulher tem 6° sentido
para essas coisas, sabemos quando alguma piranha está interessada no nosso
homem em 3 segundos (se ela for discreta).Sentamos em uma mesa do lado de fora
porque graças a tudo Caetano tinha amigos fumantes também, o que significava que
eu não precisaria deixar ele e a piriguete ruiva (eu tinha falado que ela era
ruiva? Pois bem, ela era ruiva.Mamãe sempre me ensinou a não confiar em
ruivas.Talvez por isso eu tenha pintado o cabelo de vermelho) sozinhos na mesa.O bar era legal , diferente do que eu
pensei, com alguns discos velhos na parede e cerveja bacana.Caetano sentou
do meu lado, como de costume, e a piriguete sentou do lado dele.
Pedimos cervejas e começamos a conversar.Caetano tinha uma
amigo (ainda tem, Caetano não morreu e esse amigo também não) que tinha o
apelido de Ross hoje em dia eu sei que é porque a ex dele o trocou por uma garota).A
questão era que Ross era muito legal e começamos a conversar sobre marcas de
cigarro e coisas do tipo até que ele levantou para ir ao banheiro e eu percebi o
quanto Caetano estava animado com o papo com a piriguete ruiva.E ela estava
pirigueteando como uma piriguete que se preze , com direito a perna cruzada,
risada alta de toda e qualquer coisa que ele falava e elogios sobre a textura
do cabelo e tecido da camisa.E ai eu percebi que era a noite onde eu estava
sendo friendzonezada oficialmente.Pensei que começaria a tocar “Anna
Julia”(hino da friendzone) e eu ganharia
uma faixa, uma coroa, iria no palco discursar sobre o ocorrido e desejaria a
paz mundial no final do discurso, mas nada disso aconteceu.
Acendi um cigarro e fiquei quieta fumando, enquanto ouvia os
‘HAHAHAAH’ da piriguete e achando que Ross estava demorando demais no banheiro.Ross
era legal e bonito, não tão bonito como Caetano, mas se o plano dele era me
deixar na friendzone e pegar a piriguete ruiva, ele não ligaria eu pegasse o Ross,
não é mesmo?
Ross voltou do banheiro e continuamos a conversar, até que
Caetano cutucou meu braço e pediu para eu ir com ele até o balcão (que ficava
dentro do bar) para comprar cigarros.Obedeci e fui.
- Parece que você se deu bem com o Marcelo – ele disse em um
tom meio emburrado e olhando para a frente.
- Marcelo? Quem é Marcelo?
- O Marcelo.Ah, você deve ter o conhecido como “Ross” – ele
fez aspas com os dedos no ar.
- Ah sim.Ele é legal, e engraçado – e não me deixa de canto
para conversar com nenhuma ruiva, pensei em acrescentar.Mas eu era bff não é?
Não é papel de bff falar essas coisas - e me contou que faz faculdade com você.
- É, faz sim – colocou as mãos no bolso e chutou uma tampa
de long neck para longe com o all star surrado.
- E você está se dando bem com ruiva – minha vez de dizer
como quem não quer nada.
- A Cíntia .Ela é legal sim, e engraçada – ele me olha nos
olhos – e ruiva.
- E ruiva – eu constato.Graças a tudo, era chegada a nossa
vez no balcão.Eu compro um maço do meu blue ice, ele do filtro vermelho e
seguimos para a mesa.
Antes de chegar, a pessoa que estava no som resolveu
sacanear e enfiou um “Black” do Pearl Jam no meio da nossa cara.Ouvimos alguns
“ows” femininos de algum canto da sala, e alguns casais foram para o meio do
bar dançar.Era uma cena legal, ver caras de jaqueta de couro e cabeludos se
acabando nos braços de alguma menina bem menor do que eles, ao som de uma banda
grunge que provavelmente eles detestavam.
Estávamos chegando na mesa quando Caetano passou na minha
frente e colocou o maço de cigarros dele perto da carteira que estava na
cadeira.Pegou o meu e fez a mesma coisa e pegou na minha mão.
- Vamos dançar?
Opa.Você não dança “Black” com a sua bff.E ele também não
vai dançar comigo, já que eu não sei dançar.Mas quando vejo, já estamos no meio
do bar, no meio de tantos casais e tantas jaquetas de couro.No meio de coturnos
, estava o all star azul do Caetano, e no meio de tantas tachinhas, estava
minha corrente dourada.
- Eu não sei dançar – disse rindo, estando até um pouco a
vontade, graças a intimidade que eu já tinha com meu novo melhor amigo.
- Eu te ensino, vem cá – ele trouxe meu corpo junto ao seu e
colocou uma mão no meio das minhas costas.Com a outra, colocou minha mão em seu
ombro, e depois pegou minha mão livre e a segurou com força, perto do seu rosto
– até aqui foi fácil – olhou nos meus olhos e sorriu .E eu estava meio tonta
com a proximidade – agora se concentra em mim.Eu me concentro na música.E eu te
guio.
Era realmente fácil, não sei se porque ele era muito bom ou
porque eu estava completamente confortável de estar ali, aninhada no seus
braços.Nos não falamos.Eu encostei a cabeça no seu ombro e fechei os olhos,
desejando que aquela música nunca acabasse.Por um momento, abri meus olhos e
olhei em direção a mesa, onde a piriguete ruiva olhava e cochichava com a
amiga.Certamente muito puta por ter perdido o homem dela.
A música acabou.O som voltou a passar alguma banda que eu
não gostava muito (Megadeth, pelo que estão falando).Ele me abraçou com
força.Nós rimos.
Eu me soltei dele e fui em direção a mesa, e por algum
milagre divino, Caetano pegou minha mão enquanto eu virava.
- Vamos dançar mais essa – ele disse olhando para o chão.
- Mas não é uma música lenta – me arrependi da frase logo
depois que eu terminei de pronuncia la.
- Tudo bem... só fica mais um pouco aqui.
Eu sorri.Ele me colocou na posição de dança, com muitos
olhares espantados e alguns “ows” femininos de algum canto.
E ai, na metade do refrão, ele me beijou.E eu rasguei a faixa de BBF mentalmente.
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