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7.10.11

Despedida.

 Para ouvir:Feito pra acabar - Marcelo Jeneci

- Vamos, eu conheço um lugar por aqui.
Aquilo não poderia acabar bem.Não tinha a minina chance de isso acabar bem.Não havia nenhuma probabilidade ao meu favor , mas em qual mundo uma ariana respeita o conceito de chance e acredita em probabilidades?
- É longe ? - perguntei torcendo para que não fosse.Eu ajo por impulso, sempre foi assim.Mas os impulsos desaparecem quando se tem algum vácuo de pensamento.A razão chega com o tempo, e esse tempo eu não queria ter.
- É perto.Bem perto.
Paramos em frente a um prédio antigo.A rua ainda estava molhada pela chuva que caíra antes, e o ar estava com aquele cheiro de chuva.Alias, cheiro de asfalto quente molhado.Típico de verão.Porém, o vento estava gelado.As 3 da manhã, o que você esperava Cecília?.O vento é sempre frio as 3 da manhã.
O carro parou e ele desligou o rádio.Sem música, pude sentir a razão voltando lentamente.Tentei afasta-la, olhando para aqueles olhos.Os olhos mais lindos de que já se teve notícias.Ele percebeu e sorriu, um sorriso malicioso que estava em total desacordo com o seu rosto angelical.Não que isso o deixasse feio, muito pelo contrário.Só deixava a razão mais longe.
Coloquei o salto vermelho pra fora do carro e o vento frio foi como um balde de água fria.Parece que alguém estava tentando me fazer acordar de tudo aquilo.Me encolhi tentando voltar ao torpor que me encontrava.Senti algo quente nas minhas costas.
- Toma, é melhor você colocar isso.O vento está glacial - colocou a jaqueta de couro nas minhas costas.
- Não, não precisa - disse só por educação.De fato estava frio,e eu não sabia se ainda teríamos que andar muito.
- Apenas aceite - disse colocando os braços sobre meu ombro.
Caminhamos assim até o outro lado da rua.O perfume dele fazia com que a razão não se aproximasse muito.Ela estava ali, só esperando uma fenda na armadura de pele e perfume que ele formara ao meu redor.Não tente dona razão.Acho que dessa vez você perdeu mesmo.
Ele me soltou para abrir um portão grande de ferro e eu temi que senhora razão se instalasse em mim naquele momento.Mas não, ou ela havia desistido ou ficou pro lado de fora do prédio.Lá dentro estava escuro ( a pouca iluminação que havia vinha de uma grande janela no fim do corredor) mas dava pra reconhecer uma escada a poucos passos.Lá dentro não fazia frio.E não havia nenhum resquício de razão.
Subimos a escada em silêncio e paramos em frente a uma porta.O número era 347.Fiz os cálculos mentalmente como sempre.Já havia um 7. 3+4 =7.Dois setes no mesmo numero.Era o sinal que eu precisava.
Ele abriu a porta e me fez sinal com a mão para eu entrar primeiro.Entrei.Não tive tempo para me virar ou para olhar o apartamento (que parecia muito bem decorado a primeira vista que durou 51 centésimos de segundo).Só senti as mãos na minha cintura é a saliva no meu pescoço.Já não existia mais nada.De longe ouvia que a chuva recomeçara com força total, o que me dava algumas horas a mais nesse apartamento quente.Senti suas mãos tirando a jaqueta que se encontrava sobre meus ombros.Me rendi.Abri os olhos e o vi de olhos fechados.Não havia mais o que fazer,a não ser sentir tudo o que eu estava guardando a tanto tempo.Tudo nele era lindo.A pele branca dava o contraste perfeito para o preto da tinta das tatuagens.O cabelo bem preto e sempre bagunçado.O xadrez verde , os jeans apertados e rasgados.O gosto de cigarro na boca.Senti o colchão nas minhas costas.
Acordei horas depois (não sei falar ao certo quantas, porém já fazia sol).O sol batia nas minhas costas e ardia.
- Bom dia pequena - ele sorriu.Escorado na janela do quarto (que eu não havia notado na noite anterior) com uma regata branca, os mesmos jeans da noite anterior e uma caneca nas mãos - pensei que tu não fosse acordar nunca.
- Podia ter me acordado - disse me levantando devagar.Mesmo com o cuidado , tudo girou ao meu redor - que horas são?
- Quase dez.
- Que dia da semana é mesmo?
- Domingo.
Deitei de novo.Ouvi ele deixando a caneca em algum lugar.Ligou o rádio ao fundo que tocava Beatles.
- Penny Lane - sorri de olhos fechados.Ele me abraçou.
- Eu sei que é a sua favorita.
Aquilo não daria certo.
-Acho melhor eu sair logo daqui - me virei para ele.
- Fica - ele deu um beijo na minha testa - você é linda quando acorda.
Corei.Aquilo não estava certo, mas havia mais alguma coisa a se fazer?
- Eu vou embora amanhã - ele disse olhando nos meus olhos - porque isso demorou tanto tempo para acontecer?
- Não sei.Mas preferiria que não tivesse acontecido - abaixei os olhos para tentar ser forte.
- Não fala assim pequena.Isso foi a melhor coisa que podia ter acontecido.Vou me lembrar disso todas as noites.Eu volto pequena.Não quero perder você... já passamos tempo demais um sem o outro.
- Eu não vou te esperar - disse falando o óbvio - é tempo demais.
- Não tô pedindo para você me esperar.Não precisa parar no tempo , viva sua vida da melhor maneira possível.Vamos nos falar todos os dias e se for pra acontecer , vai acontecer quando eu voltar.Mas - ele riu e bateu o dedo no meu nariz- vou torcer para você estar sozinha.Vou sair do avião e ir direto para seus braços.Espero que não haja ninguém no meu lugar.Porque esse lugar é meu pequena.Você sempre soube disso.
O abracei, achando de um jeito imbecil que se eu o abrasasse, poderia impedi lo de ir.E recomeçamos tudo o que fizemos na noite anterior, ambos tentando esquecer que alguns anos passariam até ele voltar ao lugar dele.Que era dele,nós sempre soubemos disso.

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